quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Cynthia McKinney, direto da Líbia

Cynthia McKinney, direto da Líbia

September 2, 2011

Cynthia McKinney foi a primeira deputada negra eleita na Georgia. 
Foi deputada durante seis legislaturas pelo
Partido Democrata de 1986 até 2007. 
Foi candidata à presidência pelo
Partido Verde dos EUA, em 2008. 

Um dia depois de rebeldes apoiados por EUA/OTAN terem invadido Trípoli, Cynthia McKinney falou, na Universidade Estadual de Cleveland, no centro de Cleveland, sobre sua viagem à Líbia, em missão para recolher informações. A palestra do dia 22/8, que estava agendada há semanas, desde muito antes dos dramáticos eventos em Trípoli, é parte da viagem por 21 cidades, que a deputada que exerce seu 6º mandato e foi candidata à presidência dos EUA pelo Partido Verde. 

Recebida e escoltada por uma guarda de honra do Partido dos Novos Panteras Negras vestidos de preto e com boinas pretas, McKinney começou sua palestra mostrando semelhanças entre o modo como a imprensa-empresa dominante repetidamente mentiu ao povo norte-americano sobre a Líbia, e frases do ministro da Propaganda do estado nazista Joseph Goebels – “Se uma mentira é repetida mil vezes, o público acabará por acreditar”. Como termo de comparação, lembrou uma frase de Muammar Gaddafi: “Uma verdade que se diga ao povo esmaga mil mentiras”. 

Disse que, desde a guerra hispano-americana, a imprensa-empresa dos EUA tem sido cúmplice dos objetivos da guerra imperialista dos governos dos EUA. Citou exemplos recentes, como a propaganda que levou à Guerra do Vietnã, à Guerra do Golfo e à Guerra do Iraque. 

A palestra foi patrocinada por uma coalizão ad hoc de várias organizações da área da grande Cleveland. Entre os patrocinadores estão a Coalizão de Ação pela Paz de Cleveland, o Partido dos Novos Panteras Negras, as organizações Nação do Islã, Direito de Retorno aos Palestinos, a Associação Árabe-Americana de Cleveland, o grupo Código Pink e a União de Estudantes Negros, dentre outras.
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Como a confirmar o que McKinney dissera, no dia seguinte à sua palestra em Cleveland Saif al-Islam, filho mais velho de Muammar Gaddafi, que a imprensa-empresa informara que fora capturado pelos rebeldes, apareceu em Trípoli, perfeitamente livre, e falou com jornalistas. Mais tarde, os rebeldes noticiaram que, ninguém sabia como, Saif escapara da prisão. A história dessa miraculosa fuga não foi repercutida nos jornais e televisões, que passou a dedicar-se, com estardalhaço, à invasão do complexo onde Gaddafi vivia em Trípoli, bombardeado ininterruptamente durante vários dias pelos jatos da OTAN.

“Desde a guerra hispano-americana, a imprensa-empresa dos EUA tem sido cúmplice dos objetivos da guerra imperialista dos governos dos EUA”.

Quando a rebelião eclodiu, McKinney estava na Líbia, participando de uma Conferência Panafricana para africanos da diáspora. Foi convidada para a Conferência, como resultado de ter participado do movimento da Flotilhas da Paz que tentaram chegar a Gaza. Ela falou sobre aquela experiência. 

Na primeira tentativa de levar ajuda humanitária a Gaza, o barco em que ela estava foi abordado por um barco de guerra israelense, em águas internacionais, no meio do Mediterrâneo. Contou que ninguém sabia se sobreviveria ao ataque. A experiência foi particularmente assustadora, porque, disse ela, não sabe nadar. Disse que os sacrifícios pelos quais passaram alguns de seus heróis, como Martin Luther King, Jr., Fred Hampton e Malcolm X, serviram-se lhe amparo e inspiração durante aquela provação. 

Na segunda viagem, sempre tentando chegar a Gaza, foi seqüestrada por soldados israelenses e mantida numa prisão, em Israel, por sete dias. Inspirada na “Carta de uma Prisão em Birmingham”, de Martin Luther King Jr., escreveu sua “Carta de uma prisão israelense”, dia 6/7/2009. 

Disse que as matérias jornalísticas que falavam de ataques, pelas forças de Gaddafi, contra “manifestantes pacíficos” foram mentiras criadas pela imprensa-empresa, para servir como pretexto para a guerra. Segundo McKinney, os chamados ‘rebeldes’ estavam sendo financiados e armados pela OTAN e por Forças Especiais israelenses, para gerar agitação e iniciar um movimento para derrubar o governo de 41 anos de Gaddafi. 

McKinney diz que as notícias distorcidas publicadas pela imprensa-empresa, de atrocidades que teriam sido cometidas por Gaddafi foram imediatamente desmentidas pela Anistia Internacional. Em relatório de investigação feita dia 2/7/2011, sobre os crimes dos quais Gaddafi está sendo acusado e que podem levá-lo a julgamento pela Corte Internacional, a Anistia Internacional diz que não encontrou qualquer evidência que comprove a veracidade das acusações. Mas a Anistia Internacional encontrou provas, sim, de que os rebeldes estavam fabricando ‘provas’ falsas.

A “ajuda humanitária” acabou por se converter em bombardeio ininterrupto contra a Líbia por aviões da OTAN, inclusive contra Trípoli, cidade de 2 milhões de habitantes. McKinney disse que só numa noite, durante o bombardeio de Trípoli, contou 89 explosões.

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O governo de Barack Obama foi o principal incentivador dessa guerra, com os governos de Grã-Bretanha, França e Canadá. “Diferente de governos anteriores, incluindo os dois governos Bush, a Casa Branca de Obama recusou-se a pedir autorização ao Congresso para enviar o exército dos EUA à guerra contra a Líbia.” Como desculpa, Obama disse que não era guerra, mas apenas ‘ação militar cinética’.” 

O deputado Republicano de Ohio, Dennis Kucinich, disse, na ocasião, que, ao ignorar a “Lei dos Poderes de Guerra” Obama cometeu crime que justificaria ação de impeachment do presidente. (...) 

McKinney, que foi a primeira negra a representar a Georgia na Câmara de Deputados, foi a única congressista a questionar as circunstâncias suspeitas que envolvem os ataques do 11/9 – usados para justificar a Guerra do Afeganistão e a mais ampla “guerra ao terror”. Por causa desses questionamentos sobre o papel do governo Bush no 11/9, os bushistas, coordenados pelo AIPAC (American-Israeli Public Affairs Committee), injetaram centenas de milhares de dólares na campanha eleitoral de sua concorrente nas primárias do Partido Democrata, Denise Majette. Segundo McKinney, os doadores do AIPAC, muitos deles de fora do estado, aplicaram mais de $1 milhão para derrotá-la em 2002. 

Em 2004 McKinney voltou a ser eleita, mas foi novamente impedida de concorrer nas primárias de 2006, depois de um incidente no qual um segurança do Capitólio impediu-a de entrar no prédio porque ela não estava usando na lapela o pequeno broche de congressista. Em declaração no inquérito policial, o policial acusou McKinney de tê-lo esmurrado. O incidente saltou para as manchetes. Seus companheiros de Partido e vários líderes de movimentos pelos direitos civis desertaram e não a apoiaram. 

Dessa vez, sua adversária arrecadou, num só dia, de doadores milionários, mais de 100 mil dólares. Depois de derrotada pela segunda vez, McKinney deixou o Partido Democrata. Em 2008, concorreu, pelo Partido Verde, à presidência dos EUA, contra Barack Obama e John McCain.

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McKinney listou várias razões pelas quais a derrubada de Gaddafi era interessante, do ponto de vista das potências ocidentais e de Israel. Primeira, e principal, a Líbia é país riquíssimo em recursos naturais, principalmente petróleo e água. A Líbia tem a maior reserva de petróleo da África. Está em território líbio, também, o Grande Rio Subterrâneo, o maior projeto de dutos subterrâneos e aquedutos construído com recursos exclusivamente líbios, para abastecer com água potável cidades e vilas do deserto e que abastece também o litoral mediterrâneo. 

Sob o governo de Gaddafi, a Líbia converteu-se em importante oportunidade de negócios e investimentos para os chineses. Nos primeiros dias do bombardeio da OTAN, a China evacuou rapidamente cerca de 36 mil trabalhadores. Quando a ONU aprovou a implantação de uma zona aérea de exclusão na Líbia, China e Rússia poderiam ter vetado, mas não o fizeram, apoiando de fato o bombardeio da Líbia. Ainda não se sabe por que não vetaram. 

Para McKinney, uma das principais razões pelas quais Gaddafi foi atacado foi o empenho de seu governo em promover o desenvolvimento de uma África unida. Segundo ela, o governo de Gaddafi oferecia cerca de $90 bilhões em assistência econômica a países africanos. Destacou o fato de que Gaddafi financiou forças antiapartheid na África do Sul. 

No governo de Gaddafi, disse McKinney, os líbios tinham assistência médica pública, universal e gratuita, educação gratuita até a universidade e programas para aquisição de moradias, sem juros. Como Castro em Cuba e Chavez na Venezuela, Gaddafi representa uma ameaça ideológica à oligarquia global capitalista, garantindo meios alternativos de desenvolvimento para povos do Terceiro Mundo. Por isso foi demonizado pela imprensa-empresa ocidental e, também por isso, foi derrubado. 

McKinney acredita que a chamada “Primavera Árabe” nada mais é que a aplicação de políticas planejadas por destacados neoconservadores no documento “A Clean Break: A New Strategy for Securing the Realm”.[4] Esse documento foi redigido para o governo de Israel por um grupo liderado pelo ex-vice-secretário de Defesa de Reagan, Richard Perle. “A Clean Break” prega derrubada de governos em todo o Oriente Médio, para promover a hegemonia de Israel na região e permitir que Israel expanda seu território. Lá se recomenda a ‘troca de regime’ no Iraque, nos territórios palestinos, no Líbano, Síria e Irã. 

As ideias de “A Clean Break” foram expostas em reunião no Pentágono, apenas 10 dias depois do 11/9, da qual participou o general Wesley Clark. Segundo Clark, o Pentágono tem planos prontos para atacar sete países: Iraque, Síria, Líbano, Líbia, Somália, Sudão e Irã. 

Ao final da palestra, quando se ouviram perguntas do auditório, um dos presentes (cerca de 200 pessoas, metade de negros norte-americanos), perguntou se McKinney entendia que Barack Obama deva ser acusado por crime de guerra. Ela respondeu imediatamente: “Sim, é claro. Claro que sim.” Foi ovacionada, aplaudida de pé. 

Tradução: Vila Vudu 
Publicado no site amarchaverde

Original em Bob Baldwin, The Bloomington Alternative 

Recebido de Sérgio Caldieri, a quem agradecemos.

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