26/10/2011 -
às 17h36 - atualizada às 17h37 - AFP
O Senado uruguaio aprovou um projeto de lei
que declara imprescritíveis os crimes cometidos na
última ditadura (1973-1985), que caducariam em 1º de novembro, com a
rejeição da oposição e o anúncio de ações legais por parte de militares
reformados.
Após quase dez horas de discussão, os senadores aprovaram
com os votos do governista Frente Ampla (esquerda) - 16 votos em 31 - o projeto
que agora passou à Câmara dos Deputados, onde será
debatido nesta quarta-feira.
A lei "reestabelece o pleno exercício da pretensão
punitiva do Estado para os crimes cometidos na aplicação do terrorismo de
Estado" até 1º de março de 1985, data do retorno à democracia.
Além disso,
declara estes crimes como "de
lesa-humanidade, em conformidade com os tratados internacionais" e afirma
que "não se computará prazo algum, processual, de prescrição ou de
caducidade" para seu julgamento.
Até agora, os acusados - aproximadamente uma dezena,
entre os quais os ex-ditadores Gregorio Alvarez e o já morto Juan María
Bordaberry - foram condenados por homicídio qualificado, um crime que
prescreverá em 1º de novembro para os crimes cometidos durante esse período,
pelo que as causas nas quais não houve processo seriam arquivadas.
A votação foi
realizada com aplausos por parte de uma centena de pessoas que presenciavam a
sessão.
"Se estes casos prescreverem, será paradoxal
e talvez um deboche em relação aos familiares, que em tempos de ditadura
obviamente não podiam pleitear nem pedir justiça, e que quando se abre a
democracia, se decreta a Lei de Caducidade ou de impunidade", disse
nesta terça-feira o senador governista Rafael Michelini, ao informar sobre o
projeto.
A Lei de Caducidade foi (havia sido) aprovada
em 1986, quando a Justiça começava a citar os militares por violações aos
direitos humanos cometidos durante a ditadura, e um ano e meio depois foi
aprovada outra norma que anistiou os presos e perseguidos políticos.
O Poder
Executivo, que segundo a Lei de Caducidade devia autorizar quais casos de
violações aos direitos humanos podiam ser julgados, não o fez durante os 20
anos nos quais foi controlado pelos partidos tradicionais Colorado e Nacional.
Com a chegada da esquerda ao poder, em 2005, o então
presidente Tabaré Vázquez deu luz verde aos primeiros julgamentos.
Em março deste ano, a Corte Interamericana de Direitos
Humanos (CIDH) ordenou que o Uruguai investigasse e julgasse os crimes da
ditadura, mas dois meses mais tarde uma
tentativa do governista Frente Ampla (FA) para suprimir a Lei de Caducidade
fracassou no Parlamento pela desobediência de um de seus deputados.
Desde então, o
presidente uruguaio, o ex-guerrilheiro José Mujica, revogou mais de 80 atos
administrativos de outros governos que tinham impedido as investigações.
- Questionamentos e denúncias -
Em um duro
debate, com permanentes referências ao passado e à saída da ditadura, os três
partidos de oposição rejeitaram o projeto, afirmando que este vai de encontro à
vontade da população, que em duas consultas populares (em 1989 e 2009) não
aprovou a anulação da Lei de Caducidade.
O senador do
Partido Nacional Jorge Saravia, que se desvinculou do FA após o debate anterior
sobre a Lei de Caducidade, qualificou o projeto como "um golpe de
Estado", assegurando que "parece haver ânsia de vingança, no lugar de
respeito pelo voto das pessoas".
A ditadura
deixou 38 desaparecidos no Uruguai, segundo a Comissão para a Paz, que
funcionou de 2000 a 2003 para investigar o destino dos desaparecidos. Na
Argentina, foram denunciados outros 182 desaparecimentos de uruguaios, no
Chile, oito, no Paraguai, dois, e no Brasil, um.
Militares reformados, no entanto, anunciaram na terça-feira
ações judiciais contra ex-membros de grupos armados da década de 1960 e 1970.
"Estamos
em igualdade de condições para realizar denúncias contra as pessoas que
cometeram crimes e não foram julgados, nem processados, nem cumpriram nenhum
dia de prisão", disse à AFP o presidente do Centro Militar, coronel
Guillermo Cedrez.
Cedrez disse
que se basearão na sentença da CIDH e no Pacto de San José de Costa Rica, que
sustentam "que não devem ser concedidas nenhum tipo de anistia".
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