domingo, 17 de maio de 2009

Aonde a Petrobras está levando o Rio de Janeiro...

Dia de hoje está difícil; não sei onde vamos parar...
João Cabral de Melo Neto
em Morte e Vida Severina,1956


  • Quero voltar a poder tomar banho de mar na ilha do Fundão, onde está a UFRJ. Ali, também, tudo está degradado há muito tempo, pelo óleo da Petrobrás.

Esta não é uma leitura de enlevo,

apesar de ser, por demais, necessária


É complicado mesmo, brigar contra uma multinacional, mesmo que BRASILEIRA.

Conheço um sítio em Mauá-RJ, há mais ou menos 35 anos. Iamos para lá pescar (de tarrafa) quando eu tinha uns 8 ou 9 anos. Imagine a cena: uma família adoravelmente farofeira que fazia piqueniques levando o cachorro (porque ele, membro da família não poderia ficar sozinho, abandonado em casa, enquanto seus pais e irmãos iam se divertir!) para pescar na praia de Mauá, para as bandas de São Francisco, perto do cais que a [assim chamada] família real usava quando saía do RJ para pegar o trem e ir para Petrópolis.

Andando de bicicleta (velhos tempos!), conheci as ruínas de um cassino que era badaladíssimo nos tempos de Getúlio e mesmo de Castelo Branco. O “povo” vinha escoltado com seus iates, tudo escondidinho, discretíssimo.

Foi-se o tempo em que a recuperação deste acervo maravilhoso pontuou o imaginário de uns poucos. A ganância de muitos destruiu qualquer possibilidade.

Enfim: os bailes de sanfona ficaram para um passado, da mesma forma que um sujeito que se escondia em uma ilhota entre Mauá e São Gonçalo que fora preso e torturado na época da repressão. Assustadíssimo, não se aproximava e nem se deixava aproximar. Encurvado de barbas longas, sempre sozinho, pescando, voltando sozinho para sua ilha-prisão-moradia onde deve ter se transformado em peixe ou carangueijo.

Dos bailes de forró com luz de lampião, com seus pés de valsa saindo do meio do mato, pedindo permissão para dançar com mulher casada, em que mães ensinavam os primeiros passos do bailado para seus filhos e filhas, somente na memória de uns poucos.

O triste, entre tantas tristezas, é ver que as pessoas sabem que Mauá morreu e que só resta vender seu sítio para a Petrobrás porque aqueles distritos de Magé (feudo de várias famílias que se revezam no poder municipal e estadual) estão fadados ao esmaecimento, a desertificação.

Ainda peguei uma Magé vocacionada para a agricultura, com investimentos de toda ordem. Hoje não sobrou nada. Mauá tinha um pescado maravilhoso. Hoje temos vastas áreas danificadas e regiões desertificadas de pessoas.

Uma família que se estabelece em Mauá - e arredores - sabe que só poderá ficar lá por um tempo, ou ficam até seus filhos chegarem ao ensino fundamental ou depois de aposentados. A vida produtiva não existe mais nestas localidades, as possibilidades de sustentabilidade são absolutamente restritas. O preço do transporte é caríssimo: em torno de 7 a 8 reais, só de ida, nenhum “patrão” paga. Além de as condições dos veículos serem altamente precárias.

Então, só resta ao povo vender o que tem para a Petrobras que desenvolveu um programa de asfixiamento a longo prazo.

Quando vou por lá, fico arrasada. Meu pai mora em uma região chamada de Volta da Ferradura. Absolutamente linda, com sua vegetação fantástica, nascentes, terra boa para tudo. Toda a parte da frente - pelo menos uns cinco sítios da entrada nas duas pontas da ferradura – foi comprada e os morros que existiam, acabaram-se, só existe tubulação e barro vermelho.


Está tudo descaracterizado. Meu pai, como todos dali, só pode sonhar com o dia que a Petrobras irá comprar seu sítio (pagam por cada pé de planta frutífera), com muita tristeza, mas sabem que é um caminho sem volta.

Está tudo descaracterizado. Falando com meu pai sobre este monstro engulidor de terras e vidas, perguntei sobre os que não eram donos de chão; como fariam os posseiros, os "antônios da vida"; e meu pai, triste e cabisbaixo: "Não sei. Acho que vão ficar por aí. Eu queria poder terminar meus dias aqui, com essas pessoas com quem eu convivi por tantos anos, mas nem eu sei o que acontecerá. Está tudo sendo transformado. Os sítios bonitos, as casas bem montadas, as plantações, tudo está sendo destruído para passar as tubulações da Petrobras. Aqui acabou. E quem não tem terra, não tem nada, não será indenizado porque nunca tiveram nada."

Essa é uma realidade que não é só de Mauá. Com Maricá, daqui a pouco, farão a mesma coisa. Foi feito isso em Campos, Macaé, o mesmo se dá com essa história de mexerem com o Rio São Francisco.

É o progresso... E, com ele, a velha discussão do quê, para quê, para quem serve o progresso. Bom para uns poucos e terrível para muitos.


O litoral de Mauá e outras localidades por onde passam (passarão) os dutos da Petrobrás, em Magé, estão descaracterizando a região, empobrecendo sua população - que mora ali há pelo menos dois séculos. Não esquecendo que ali existia a rede ferroviária que levava a família real para Petrópolis.

Várias culturas se perdendo, a Petrobrás promoveu vários desastres ecológicos e os recursos obtidos através das multas efetivamente pouco chegaram para a melhoria local.

Violência policial aumenta e pescadores de Magé são detidos

Agência Petroleira de Notícias

reflexões de Sandra Martins - smartins
-

Nenhum comentário:

Postar um comentário